O ChatGPT não me convence
Nas últimas décadas, o predomínio da
lógica binária abriu as portas a uma nova forma de inteligência a que foi dado
o nome de Inteligência Artificial (IA).
A IA está na “ordem do dia”
das questões e dos debates a nível planetário. Com os seus extraordinários
avanços, as suas potencialidades, inimagináveis, e os seus perigos, bem
concretos; e com os problemas de diversa ordem, sobretudo legais e éticos. Estamos
no reino em que as máquinas superam, em muito, as competências humanas.
Sobretudo, pela sua capacidade em analisar e combinar uma imensidão de dados ou
de, neles, encontrar padrões aos nossos olhos invisíveis. É, aliás, isso que
fazem o chamado ChatGPT e outras aplicações similares.
O algoritmo
GPT (em português, Transformador Gerador Pré-Treinado) é um modelo de linguagem
baseado em redes neurais para processar e gerar textos. O GPT é “treinado”
através de um grande conjunto de dados como textos da Internet, e “aprende” a
capturar padrões e estruturas linguísticas. O que convirá não esquecer é que
programas de computadores, ou algoritmos, nada mais são que sequências de
instruções escritas por programadores. Tal circunstância levanta questões muito
atuais: podemos atribuir criatividade aos robots e à inteligência
artificial? Os algoritmos conseguem produzir arte?
Vamos por
partes. A IA vive no mundo do digital e opera nele. Ou seja, só
reconhece o que está digitalizado. O que não está não existe. Por outro lado,
os algoritmos trabalham unicamente com dados numéricos. Quaisquer dados
(textos, imagens, sons, modelos 3D, o que quer que sejam) são sempre
processados como números – mais especificamente como sequências de bits,
unidades que podem assumir apenas dois valores: zero ou um.
Outro dado inapelável: os algoritmos
são escritos por pessoas e apenas executam as instruções do seu código, de
forma predeterminada. Um programa nada pode criar além do que o seu programador
seja capaz de criar. O resultado é algo de perverso: a IA tem sempre
resposta e quando não sabe, inventa. Pelo que algumas das suas descrições são
fantasiosas e frequentemente erradas. Dado que a generalidade das pessoas
acredita em tudo o que lhes apresentam, a fabricação de novas realidades,
falsas, está, em curso. E, nesta matéria, a IA é sofisticadíssima na
medida em que não deturpa simplesmente a realidade, como fazem jornais e
televisões, mas cria uma nova realidade virtual, enganadora, falsa.
Um dia destes fiz uma experiência: solicitei
ao ChtatGPT que me escrevesse um poema de amor. O resultado foi um chorrilho de
banalidades, vulgaridades e lugares comuns, com versos estafadíssimos, tipo “Tu
és o sol da minha vida”… Absolutamente dececionante.
Não sei, num futuro próximo, qual a
direção que a IA irá tomar. O que sei, para já, é que o ChatGPT não me
convence. E temo que a área da cultura seja, no imediato, a mais afetada. Por
isso, para que artistas, escritores, compositores, realizadores, criativos,
designers, arquitetos, fotógrafos e gráficos não venham a ser substituídos por IA,
é imprescindível que haja regulação externa, ou seja, dos governos. Por outro
lado, e porque sou escriba e cooperante da Sociedade Portuguesa de Autores, defendo,
perante esta nova realidade, um enquadramento legal que reconheça, aos agentes
acima referidos, outras formas de direitos de autor e de propriedade
intelectual.
Infelizmente a confusão já está
instalada. Em abril deste ano, o primeiro prémio de um concurso internacional
de fotografia foi ganho por Boris Eldagsen, com um retrato clássico, a preto e
branco, de duas mulheres, das quais emanava uma implícita cumplicidade. Eldasgen
abdicou do prémio, revelando que a fotografia tinha sido gerada por um
algoritmo de inteligência artificial a partir de instruções textuais, e
argumentando que essa metodologia de geração de fotografias não é comparável à
versão original, baseada no uso de máquinas fotográficas.
Inteligência Artificial? Por enquanto
prefiro a Inteligência Emocional.
Victor Rui Dores
Comentários
Enviar um comentário