OPINIÃO: VITOR RUI DORES | Quatro décadas de música nos Açores









Quatro décadas de música nos Açores




Contam-se pelos dedos de uma só mão as pessoas que, no contexto açoriano, se dedicam ao cancioneiro e à etnomusicologia. Por isso é de saudar a insistência e a persistência de Emiliano Toste que, numa linha de contínua e continuada investigação, vai recolhendo, registando, gravando e cantando a música tradicional dos Açores e a que vai sendo produzida localmente pelos seus intérpretes. Ele é, verdadeiramente, o nosso etnomusicólogo de serviço, cuja editora, “Açor”, leva já 27 anos de existência e com 345 CD´s editados. É obra!

Açores, 4 décadas de música em compasso perfeito é a mais recente recolha deste terceirense que há 42 anos reside no Grande Porto. Trata-se de um triplo CD, constituído em antologia, que reúne 64 temas de outros tantos intérpretes ligados à música produzida nos Açores (e/ou sobre os Açores) desde os anos 80 até à atualidade.







Unidade na diversidade, e uma iniciativa sem precedentes entre nós, este projeto discográfico tem um fio condutor: o compasso perfeito, conhecido nos velhos manuais de música como o compasso ternário ou de divisão ternária – os chamados compassos compostos. Daí que precisamente todos os temas da trilogia ora estão em compasso ternário ou em divisão ternária.

Intercalando tradição com modernidade, e a partir de diferentes padrões melódicos e universos poéticos, aqui escutamos a canção, a balada intimista, a trova lírica, o cancioneiro açoriano revisitado, o fado-canção, a música coral e de filarmónica, o pop, o rock…

Estamos perante uma modernidade enxertada na seiva da tradição; uma memória açoriana, digo, uma música ancorada na terra e no mar. Mas sempre com aquele traço de lirismo insular.

Tudo isto só pode ser a prova provada e comprovada que, nas últimas quatro décadas, os Açores têm conhecido uma fase de inegável criatividade musical e poética. Um número considerável de autores, compositores, músicos e intérpretes, profundamente enraizados na tradição popular da música portuguesa, sobressaindo a de expressão açoriana, têm vindo a dar muito boa conta de si escrevendo, compondo e cantando emoções, sentimentos e estados de alma, por um lado, e, por outro, expressando preocupações e inquietações que questionam o sentido das coisas e da vida.

Por conseguinte, apreciemos esta antologia musical de inegável qualidade. E saudemos, ainda e sempre, as pesquisas de Emiliano Toste, produtor musical que conjuga arte, investigação e técnica. E saibamos escutar o apurado sentido interpretativo e a espessura emocional destas vozes que ecoam, ainda e sempre, no nosso imaginário.

Açores, 4 décadas de música em compasso perfeito aí fica. Para fruição do presente e para memória futura.


Victor Rui Dores







Comentários