OPINIÃO: VICTOR RUI DORES | Ai esta juventude...

 



Ai esta juventude…

 

         É necessário que se diga porque é indispensável que se saiba que temos, em Portugal, uma juventude que não lê e pensa pouco. E quem não lê e pensa pouco dificilmente terá aquilo que mais importa para uma verdadeira cidadania ativa: pensamento crítico.

Dito isto, e sem querer generalizar, faz-me pena ver como hoje, nas cidades, muitos jovens vivem encarceradas em apartamentos, sem horizontes, sem árvores, encolhidos na preguiça dos seus quartos de cama, ociosos, sonolentos, indiferentes, arregimentados, passivos, olhando a rua à distância das suas janelas e varandas… O tédio enfraquece-os. E como fazem pouco exercício e abusam de junk food, é notória a tendência que têm para engordar… Depois é necessário que tudo ao seu redor seja muito fácil, muito claro e muito pronto; se assim não for, hesitam, estacam, sucumbem.

Já em crianças eles eram indecisos e irresolutos, sem iniciativa, sem determinação, sem vontade e sem interesse, sempre dependentes dos pais de quem foram recebendo uma educação mimada e amolecida... Não trazendo de casa mecanismos de autonomia, identidade e individualidade, quando chegaram às escolas já eram “abebezados” e imaturos.

Hoje, na sua larga maioria, os jovens só se interessam por smartphones e videojogos. Nos intervalos, lá vão arranjando tempo para fazer os trabalhos de casa e estudar o q.b.… Quando se portam mal, negam o que fazem. Aprendem desde muito cedo a mentir, como mecanismo de defesa. Tornam-se miúdas e miúdos irritadiços e birrentos, superprotegidos por mães e pais inseguros, que estão em início ou em fase de consolidação de carreiras, com vidas muito atarefadas, o que lhes retira tempo para um maior e melhor acompanhamento junto dos seus progenitores. Sentindo a pressão do quotidiano, e temendo não estarem a cumprir integralmente o seu papel de educadores, agarram-se ao único(a) filho(a) que têm e infantilizam-no(a) para lá do natural.



De resto, deparamos hoje com este dado sociológico inapelável: as relações entre pais e filhos horizontalizaram-se, isto é, deixaram de ser tão hierárquicas, e muitos pais encontram sérias dificuldades em controlar os miúdos em casa. O ditado popular bem que avisa: “Casa de pais, escola de filhos”.          

Depois temos as novas tecnologias da informação e da comunicação que, tomando hoje conta das nossas vidas, vieram baralhar as coisas. Assistimos, nas redes sociais, à legitimação do insulto, ao triunfo da desinformação, das fake news e a toda uma avalanche de parvoíces. Infelizmente é este mundo virtual que informa e enforma as nossas crianças e os nossos jovens.

Não há muitos anos falava-se do idealismo futurista da internet, mas esta tornou-se numa fonte de destruição e receio. E, quando na cabeça de muita e desvairada gente, deixa de haver uma distinção clara entre o que é verdadeiro e o que é falso, é obvio que estamos perante uma séria ameaça à democracia.

Com a asneira que foi a Declaração de Bolonha (que sempre me mereceu sérias dúvidas e severas críticas), os nossos jovens licenciam-se aos 21 anos de idade, um ano depois são mestres e antes dos 30 já são doutores e chegam a juízes… O primado do económico sobre o pedagógico deu nisto… Por isso, não se admirem com o estado (duvidoso) da nossa Educação, da nossa Saúde ou da nossa Justiça... A verdade é que, na “austera, apagada e vil tristeza” em que se tornou Portugal, temos o sistema que criámos. A escola reflete necessariamente a sociedade que temos e que construímos. É esta a escola que temos, não é outra. A sociedade que construímos é esta, não é a norueguesa, nem a canadiana, nem a australiana…

            Acima de tudo têm-nos faltado pactos e compromissos educativos que nos libertem da tensão do imediato, do ato eleitoral mais próximo e permitam conferir continuidade e estabilidade às políticas estruturantes do nosso sistema de ensino.     

 

                                                                                                                                Victor Rui Dores      







                                                                                   

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